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Publicado: 29-out-2025 - às 11:35


Pejotização ameaça conquistas da CLT e fragiliza proteção social, alertam especialistas

Juristas e economistas apontam que o avanço da pejotização, intensificado após a Reforma Trabalhista de 2017, reduz direitos, enfraquece a Previdência e estimula fraudes nas relações de trabalho

Marina Ramos/ Câmara dos Deputados

Especialistas em Direito do Trabalho e economia voltam a criticar o avanço da chamada pejotização — prática em que empregados são transformados em PJ (pessoas jurídicas) para reduzir encargos trabalhistas.

Durante seminário do Cedes (Centro de Estudos e Debates Estratégicos) da Câmara dos Deputados, nesta terça-feira (28), eles defenderam medidas urgentes para conter o fenômeno, que ameaça a estrutura de proteção social e a arrecadação de fundos como o FGTS e a Previdência Social.

Segundo o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), o desafio é encontrar ponto de equilíbrio entre a flexibilidade econômica e a proteção ao trabalhador.

“O avanço tecnológico e a globalização ampliaram as possibilidades de inserção no mercado, mas impõem a necessidade de preservar um mínimo de segurança social”, afirmou Motta.

Trabalho por aplicativo
Ele lembrou que a Câmara analisa o PLP 108/21, do Senado, que atualiza os limites de renda para MEI (microempreendedores individuais), e criou comissão especial para discutir o trabalho por aplicativo — PLP 12/24 — do Poder Executivo.

E ainda PLP 152/25, do deputado Luiz Gastão (PSD-CE), que também propõe garantir direitos como remuneração mínima, contribuição para o INSS, e regras de jornada e de segurança.

O objetivo de ambos os projetos de lei é criar legislação que equilibre a inovação tecnológica com a proteção social e trabalhista desses profissionais.

Efeitos da contrarreforma de 2017
A pejotização ganhou força após a Reforma Trabalhista de 2017, que flexibilizou regras da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e ampliou brechas para contratações precárias.

Desde então, o número de pessoas jurídicas cresceu 56%, enquanto o de empregados formais aumentou apenas 10%, segundo estudo apresentado pelo professor Nelson Marconi, da FGV (Fundação Getulio Vargas), com base em dados do IBGE.

Para o deputado Márcio Jerry (PCdoB-MA), presidente do Cedes, o fenômeno já causou perda de R$ 109 bilhões em arrecadação entre 2022 e julho de 2025. “Estamos diante de uma corrosão silenciosa do sistema previdenciário e do próprio conceito de trabalho protegido”, alertou.

Fraude disfarçada de empreendedorismo
O ministro do TST (Tribunal Superior do Trabalho), Augusto César de Carvalho, afirmou que a pejotização não se confunde com o MEI ou com o regime do Simples Nacional, mas se caracteriza como fraude quando há subordinação disfarçada.

“Quando o empregado vira empresa apenas para reduzir custos, estamos diante de um golpe contra a legislação trabalhista”, disse o magistrado.

Ele destacou a importância do PL 1.675/25, em tramitação no Senado, que busca coibir esse tipo de fraude.

O ministro também demonstrou preocupação com a análise do tema pelo STF (Supremo Tribunal Federal) — atualmente, todos os processos sobre pejotização estão suspensos por decisão do ministro Gilmar Mendes, até que o plenário da Corte fixe entendimento definitivo.

Risco de desmonte do sistema trabalhista
O procurador Paulo Vieira, do MPT (Ministério Público do Trabalho), alertou que a pejotização deixou de ser um fenômeno restrito a profissionais de alta renda e agora atinge trabalhadores comuns, inclusive de baixa qualificação.

“Se o STF liberar a pejotização de forma ampla, será o início do fim da proteção ao trabalho humano no Brasil”, advertiu.

Vieira lembrou que o trabalhador-empresa perde acesso a políticas públicas voltadas à inclusão e à igualdade, e citou o PL 2.938/19, em análise na Câmara, que busca reforçar o combate às fraudes. Aquele está anexado a este — PL 7.839/17 — na Comissão de Trabalho, onde aguarda parecer do relator, que ainda não foi designado.