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Publicado: 7-out-2025 - às 21:34


Pejotização ameaça Previdência: perdas passam de R$ 180 bi em 2 anos, alertam autoridades no STF

Representantes do governo alertam para o impacto da pejotização sobre a Previdência, FGTS e o pacto social de 1988. “É uma falsa modernidade que corrói a proteção ao trabalho”, afirma o AGU, Jorge Messias

Foto: Rosinei Coutinho/STF

Ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho afirmou que o MEI, que deveria facilitar a formalização, tem sido desvirtuado para mascarar contratos de trabalho com características celetistas.

O rombo é bilionário na Seguridade, com a pejotização, que já provocou déficit superior a R$ 60 bilhões na Previdência Social entre 2022 e 2024, segundo o advogado-geral da União, Jorge Messias, durante audiência pública no STF (Supremo Tribunal Federal) nesta segunda-feira (6).

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No FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), a perda foi ainda maior — acima de R$ 120 bilhões no mesmo período.

“É o pacto social de 1988 que se esvai, gota a gota, em nome de uma falsa modernidade”, advertiu Messias.

O AGU destacou que esses valores deixaram de financiar políticas públicas essenciais, como saúde, habitação e saneamento, pilares do sistema de Seguridade Social previsto na Constituição.

Desmonte da proteção social
O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, afirmou que a pejotização ameaça toda a estrutura de proteção ao trabalho, construída “com muito sacrifício de trabalhadores e empregadores”.

Segundo ele, Previdência, FGTS e o “Sistema S” deixaram de arrecadar juntos mais de R$ 106 bilhões entre 2022 e 2025.

“Se liberarmos geral, como fizemos com a terceirização, colocaremos em risco o que o país levou décadas para erguer”, alertou Marinho.

Déficit crescente
O diretor do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), Eduardo Pereira, afirmou que o déficit anual da Previdência, hoje em R$ 300 bilhões, pode chegar a R$ 900 bilhões nas próximas quatro décadas.

O cenário é agravado pelo envelhecimento da população ativa e pelo crescimento do número de MEI, que contribuem com apenas 5%, contra até 14% pagos por empregados formais.

Entre 2011 e 2024, o Brasil ganhou 14 milhões de novos contribuintes — 8 milhões deles são MEI. Outros 8 milhões sequer recolhem contribuições.

“Há um volume expressivo de pessoas jurídicas criadas apenas para mascarar vínculos de emprego, sem recolhimento e sem proteção social”, explicou.

Se apenas 10% dos empregados celetistas fossem substituídos por PJ, a Previdência perderia R$ 47 bilhões por ano em arrecadação.

Risco ao modelo tripartite
O secretário-executivo do Ministério da Previdência Social, Adroaldo da Cunha Portal, alertou que a pejotização enfraquece o sistema tripartite — em que trabalhadores, empregadores e Estado dividem responsabilidades.

“A pejotização transfere ao trabalhador a responsabilidade exclusiva pela contribuição e reduz a proteção coletiva”, afirmou.

Segundo ele, se a tendência se mantiver, o Estado passará a arcar com dois terços das despesas previdenciárias, hoje estimadas em R$ 1 trilhão.

Desvirtuamento do MEI
O ministro Luiz Marinho lembrou que o Microempreendedor Individual (MEI) foi criado para proteger trabalhadores informais, e não para substituir vínculos de emprego.

“Queremos aumentar ainda mais o buraco da Previdência? É esse o debate?”, questionou, em referência à possibilidade de uma nova Reforma da Previdência.

Ele defendeu o reequilíbrio entre os regimes e a manutenção da lógica colaborativa da seguridade social.

Concorrência desleal e fraude
O auditor-fiscal Afrânio Bezerra Filho, da Receita Federal, apresentou dados que mostram o impacto fiscal e concorrencial da pejotização.

Segundo estudo da RFB, as perdas podem chegar a R$ 26 bilhões em 2025, R$ 28 bilhões em 2026 e R$ 30 bilhões em 2027.

Caso o modelo seja aplicado de forma irrestrita, a arrecadação pode cair 90%, com impacto anual de R$ 213 bilhões.

Bezerra destacou que a pejotização cria concorrência desleal no mercado e disfarça relações celetistas. Fiscalizações identificaram práticas típicas de vínculo empregatício, como:

* emissão de notas para férias e 13º salário;
* exclusividade e remuneração fixa;
* uso de e-mails corporativos e benefícios da empresa contratante;
* sócios atuando como gerentes; e
* pagamento via folha de empregados.

“Essas PJ não demonstram crescimento real ou autonomia econômica. São, muitas vezes, trabalhadores sem proteção disfarçados de empresários”, concluiu o auditor.

Síntese
As manifestações na audiência pública indicam consenso: a pejotização, quando usada de forma indiscriminada, fragiliza o trabalho, drena a arrecadação pública e ameaça a sustentabilidade da Previdência — pilares do pacto social e constitucional de 1988.